quinta-feira, 17 de julho de 2008

Capítulo 5 - Sopros e lágrimas




Passos, inquietude e exclamações. Era tudo o que se observaria daquela figura, a figura de Victor, o lençol ao redor de seu corpo passeando em frente à grande janela de seu quarto.
- Isso não podia ter acontecido... – ia dizendo ele.
Aos poucos, Yan foi despertando de seu sono tranqüilo, ouvindo as entrelinhas dispersas de Victor, seu atual “chefe”.
- Isso definitivamente não podia ter acontecido... – continuava Victor, frenético.
Yan talvez questionou-se por alguns segundos, sem entender a razão dos conflitos dele.
- Chefe, se isso tem alguma coisa a ver com a noite passada, tudo bem. Eu posso ser ativo na próxima vez sem maiores problemas...
Victor estacou onde estava, próximo ao cesto de almofadas, e virou-se de súbito, estarrecido com Yan e seu ponto de vista.
- Tem, tem sim, tem a ver com a noite passada – e caminhou a passos largos até a cama. Era estranho. Suas palavras não soavam de acordo nem para si mesmo, como se ele estivesse espalhando dizeres alegres em aura incendiante, em fogo inimigo, em frenesi. – Foi fantástico, uma das melhores noites da minha vida. Você – e apontava na cara de Yan -, ajoelhado naquele tapete – e mirava o dedo na direção dele -, foi perfeito!
Sua voz estava espantosa, como fúria reprimida, o que trouxe certo constrangimento e aflição a Yan. Este tentava aos poucos entender e apaziguar a situação, conforme Victor observava. Estranho.
- Você está sendo irônico, chefe? – perguntou Yan, sentando na cama fofa, intrigado.
- Não, não estou mesmo – contestou Victor, negando com a cabeça. – O como aconteceu foi soberbo, mas o como... quero dizer, a situação...
Yan achava-se em meio a um longo bocejo; Victor remeteu isso ao fato de que Yan talvez não compreendesse suas palavras ordenadamente, em um raciocínio claro e cronológico. Yan esfregava os olhos e erguia-se da cama. Observava o sol tímido lá fora, esticando os braços dormentes a ponto de estralá-los; passou a mão pelos cabelos negros, voltou-se para Victor e o segurou pelos ombros.
- Me diga, chefinho, o que está lhe incomodando?
Victor perdeu (ganhou, em sua concepção) algum tempo olhando fundo naqueles olhos azuis e inchados de Yan. De repente, soltou um gemido e apoiou a testa no peito do grandalhão – como ele era grande! -. Encarou-o outra vez, lhe deu um pequeno beijo e o abraçou fortemente.
“Se certas palavras não me remetessem a certas reações... e certas atitudes não me levassem a certas conclusões... e certos olhares não me conquistassem de tal forma que meu pensamento consiga se perder ainda mais em meio aos conflitos que em minha mente já permeiam... eu poderia ser sincero, nem tanto aos outros quanto jamais a mim mesmo. Mas isso é um luxo nas minhas convenções baratas”.
- Yan, querido... não era pra ter acontecido.
Yan manteve o abraço por alguns instantes, e então deixou-o e sentou-se devagar na cama, olhando em direção à porta. O que intrigava Victor era que Yan de repente diminuíra de tamanho, ganhara uma cor clara na pele e escura nos olhos. Seus músculos foram encolhendo assim como seu cabelo, amontoando-se rente à cabeça. Yan se transformara em seu mordomo; tinha sua fisionomia, seu jeito, seu ar franzino e amedrontado de sempre. Victor não se importou, ou melhor, praticamente não notou o acontecido.
- Eu fiz algo de ruim? – perguntou Dyllan, olhando para Victor com preocupação verdadeira.
- Não – respondeu Victor, imediatamente calmo diante do interrogatório previsto.
- Eu lhe ofendi de algum jeito?
- De maneira alguma.
- Eu me apressei?
- Talvez.
Dyllan parou. Seu tronco desnudo mostrava-se ainda mais pálido que seu rosto. Tão magro era o menino que Victor podia enxergar suas costelas sob alguns pêlos negros.
- O que você está pensando, Yan?
O garoto se levantou e encarou Victor seriamente, voz seca.
- Eu não sou Yan. Não se lembra mais do meu nome?
Victor ficara confuso. Podia reconhecer o rosto à sua frente, mas seu nome...
- Eu me lembro... – divagava ele, tentando buscar a resposta no fundo dos olhos do garoto parcialmente despido. – Você é o Damien, não?
- Errou, Damien sou eu.
Um garoto parecido com o que estava na sua frente, um pouco mais forte e enrustido, porém, saiu do seu banheiro enrolado em uma toalha e vestindo uma boina verde na cabeça. Victor sobressaltou-se.
- Você estava aí!? – perguntou ele.
- É claro – Damien respondeu. – E eles também.
Por detrás de Damien, dois homens saíram de mãos dadas, ambos vestidos a rigor, em vermelho vivo, rosas brancas na lapela. Victor lembrava dos seus nomes: eram Ulysses e Philip. Tanto eles quanto Damien exibiam sorrisos incandescentes, um tanto forçados. No instante seguinte, os três desataram a rir freneticamente, e apontavam para Victor. Victor enrubescera, pois no meio do tapete ele encontrava-se transando com Yan, o verdadeiro Yan, que balançava sua cabeça em um ritmo absurdo e gritava enlouquecido. Victor aparentemente estava penetrando Yan, mas notara que seu órgão sexual mantinha-se molengo, apenas esfregando a genitália onde deveria se encontrar o ânus de Yan. “Cadê o...?”. Victor então dirigiu seu olhar para aquele garoto seminu erguido em frente à janela.
- M-meu n-nome é D-Dylly – disse ele, e incontáveis lágrimas caíram dos seus olhos. – DILLY! D-DILLY! DILLY! – e então pôs um apito cinza na boca, que agora se achava pendurado em seu peito.
Dylly soprava com força ensurdecedora, e Victor tampava os ouvidos do som agudo do apito, das risadas dos homens que saíram do banheiro e dos gritos de Yan, delirando com um prazer inexistente. Queria fugir, estava extremamente constrangido, mas não conseguia desgrudar seu corpo do corpo de Yan. E mesmo que quisesse, ele tinha que ficar... Philip iria jogar o buquê, era o casamento dele com Ulysses, Victor precisava estar presente... Yan era tão grande... o apito não parava, cada vez mais alto...









*****

2 comentários:

Alex Sword disse...

Legal.

Anônimo disse...

Surpreendente! Estou curiosíssimo para ler o resto, mas vou me acalmar por aqui. Mais tarde leio mais alguma coisa. Estou bem ansioso para algumas coisas. Está divinamente escrito, senhor Autor. Parabéns, belo trabalho.